domingo, 5 de outubro de 2008

O Raté

Jonas: Eu vô chumbá aquele preto mardito
Junin: Carma, vô. Vê lá que qui cê vai fazê!
Jonas: Eu vô é matá mesmo aquele nego fí duma égua. Tu acredita que o fi duma quenga véia, levô minha meió pinga imbora?
Junin: Vô... não se resolve as coisa assim, desse jeito. Eu vô lá conversá com o Zé... ele vai pagá tua pinga. O sinhôr vai vê!
Jonas: Ara, Junin... Não é questão de pagá... é questão de honra... a honra é a maió das virtude que quarqué fragelado pode receber nesse mundão véi de deus. E cada um tem que vigiá bem a sua.
Junin: Mais vô... não é anssim que se preza pelas nossa virtude... a vida tem que sê respeitada é em quarqué circunstância. Nóis tudo é igual perante deus, vô.
Jonas: ... e quem é que te ensinô uma asneira dessas?
Junin: Aprendi na igreja, vô. E num é asneira não!
Jonas: Pois eu vô falá cum a tua mãe, tu não vai mais pra igreja... ara sô... óia só se meu neto vai tê os miôlo cumido por esses mequetrefe de uma figa... Esse povo só qué é dinheiro, Junin... eis tão cabano com a sua inteligênça.
Junin: Vô...
Jonas: Óia só, Junin... seu vô num é homi de sabidoria igual ucê é. Mas seu vô viveu muito mais que ocê e se tem alguma coisa que eu aprendi nessa vida ordinária é que ninguém é igual a ninguém! Num importa se é perante deus ou o diabo ou sei lá o quê! Cumé que ucê qué que eu acredite que eu sô igual ao seu Milô da rua de baixo... aquele viado, fi duma quenga, que esbanja aquele luxo todo de sobejo, aquelas vaca gorda, aqueis bezerro massudo, aquela exuberança toda de capim e mí...Enquanto isso, tá aqui o pé rapado do seu avô, que num tem uma tora de madeira pra queimá, uma inxada pa ará aquela terra véia e seca imprestável que o meu pai mi dexô... Não tenho um boizin das carne escassa sequer pra calá esses barúi do bucho. E ocê quer que eu acredite que nois aqui tudo é igual?... Quando um espertin dum nêgo pilhérico leva a sua última garrafa de pinga é que cê percebe que nessa vida, a meió arma qui se pode ter não é perdão ninhum... É uma boa duma carabina regulada e carregada. Não sobra lugar présses valôr nesse mundo de hoje não, Junin. O meió qui cê faz é aprendê a si cuidar e não confiá em ninguém.
E nesse intervalo modesto de tempo, passa correndo um negro ligeiro, louco pelo estradão vermelho coberto de baquearas secas. Pulando hábil pelo solo escaldante, pra não torrar os pés descalços.
Jonas:
ORA... VOLTE AQUI SEU PRETO FÉ DA PUTA, CÊ VAI APRENDER A NUM ROUBÁ MAIS PINGA MINHA!
E em um arranque tresloucado, pelo sol abrasador, foi-se o velho Jonas à reaver o que lhe foi desprovido, aos sons de tiros e gritos rasgantes, pelas veredas desse cerrado seco de fogo.

2 comentários:

Unknown disse...

putz xD
uma lição de vida \o/
muito bom x3

Guilherme Toscano disse...

você é genio.