sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

A uma idiota que me amou

"Faire le mal pour le plaisir de le faire"
Prosper Merimée


Eu gosto de ver-te chorando,
Derramando vinho pelo manto
Branco da mesa. Co'um bando
Dos avantesmas do quebranto

A te rodear. Sou teu santo
E a mim tu rezas, ofegando
Com este bucho quase pando
De vinho barato. Teu canto

Melancólico, trás regojizo,
E eu, cruel diabo, indeciso
Penso em dar-te um alívio.

Mas a idéia foge-me à mente
E, a ti, eu desejo o quente
Inferno do eterno oblívio.

Afinal, o que é simplicidade?

Que mais é mister a um cabra,
Além de uma garrafa de pinga,
Uma mulher bonita que se abra
E um bom pedaço de caatinga?

Soneto

Sim, senhor, sim, eu ouço, sim!
Som grave, abafado esse que vem
Sei lá de onde, Sei lá de quem.
Som sem jeito, som feio, assim!

Não é som de choro, nem de frevo.
É som de nada rastando em nada;
Um som bem quieto, de madrugada.
Um som estranho, que não descrevo.

Este som de sussurro, de arrelia,
Ainda que amiúde, vem em demasia,
Aos ouvidos franzinos do cansaço.

Desabotoa o peito de um lavrador
Este som agudo, que cheira a dor,
Som de xaxado tocado em cangaço!

domingo, 11 de janeiro de 2009

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Carlos Darwin morreu na caatinga


Que seleção natural que nada...
O cabra mais macho desse sertão
É a doce figura, grossa e amada,
Do jagunço, vista curta, Lampião.

Cansado

Eu, enfadado, sento-me à velha mesa
E pergunto-me: "Diabos, em que lugar
Estaria, o alento da vida, que perdi
Pelas estradas opacas da existência?"

Deixei cair, no sono da abstinência,
Toda esta doçura ácida do frenesi.
Que maldição me assola! Quero amar,
Doar-me ao braços de uma portuguesa

Assanhada ou de uma mulata mansa.
É que ser niilista, ás vezes, cansa...
E me inspira a indagar pelo prazer,

Este aviltamento das mentes fracas,
Que se mascaram atrás de mil socapas
Para, hipocritamente, seguir a viver.

Soneto

A maior heresia de toda a língua
Francesa: Esta torpe rima, míngua
De qualquer sentido ou verossimilhança,
Que só teu vil som enfastia e cansa

Qualquer poeta, digno de si mesmo.
Maldito o povo que, labutando a esmo
O seu dialeto, criou, com detreza,
Toda a idiotice e a soberba fraqueza

Dos europeus. Do germano ao godeme,
Todos comeram deste infecto alimento
Que gera, todo mês, um morto rebento

De menestréis apaixonados. Eu repito,
Sim, outra vez, eu xingo este maldito
Contigente que rimou je t'aime a poéme.