sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Saravá, seu Zé Pilintra!

- Ô Zé, quando for na lagoa,
Vê se toma cuidado
Com o balanço da canoa!

- Ô Zé, me faça o que quiser,
Mas não me machuque
O coração dessa mulher!

- Ô, seu Zé ...
Zé Pilintra enganador.
Que enganou a minha jovem
Com palavras de amor.

- Não foi eu, não...
Foi ela quem me enganô.
Eu passava, ela dizia:
"Zé Pilintra, meu amô"

- Essa puta é minha.
Puta minha é putona.
Quem quiser puta gostosa
Que vá buscar na zona!

-Ô seu rufião,
Me dê o seu perdão.
Que muié que cai na rede
Eu não deixo na mão não.

- Zé Pilintra, tu é macho,
E macho eu respeito.
Se você quer puta boa
Eu arranjo uma no jeito.

Ao fantasma de Manuel Bandeira

Enquanto o fogo, quente e cru,
Das cinzas, queima-me o olhar.
Peço para que, ao menos no bar,
O senhor fique quieto. Mas tu...

Falando-me da mesma mulher,
Pergunta-me, ao som do luthier:
"É mesmo ela que você quer?"
Ó... meu amigo, meu caro...

Eu já nem sei que é querer.
Se isso mo fosse tão claro,
Se eu soubesse o que quero,

O senhor pode ter certeza
Que subiria naquela mesa
E lhe cantaria um bolero.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

To The Whore Who Took My Poems

some say we should keep personal remorse from the poem,
stay abstract, and there is some reason in this,
but jezus;
twelve poems gone and I don't keep carbons and you have
my
paintings too, my best ones; its stifling:
are you trying to crush me out like the rest of them?
why didn't you take my money? they usually do
from the sleeping drunken pants sick in the corner.
next time take my left arm or a fifty
but not my poems:
I'm not Shakespeare
but sometime simply
there won't be any more, abstract or otherwise;
there'll always be mony and whores and drunkards
down to the last bomb,
but as God said,
crossing his legs,
I see where I have made plenty of poets
but not so very much
poetry.

(Charles Bukowski)

sábado, 13 de dezembro de 2008

Prece à levedura

Você...
Ó criatura unicelular
E, portanto, divina,
Que da singela rotina
Faz de ofício saciar
A nossa sede tremenda.
Nós, os ébrios glutões,
Que de litros (milhões)
Enchemos a fenda,
Devemos-te reverência,
Ó Zeus da embriaguez
Ó suprema Providência.
Traga-nos, outra vez,
O verdadeiro puro sumo
Dos galhos da parreira
Para que assim, o consumo
Seja logrado. A bebedeira
Apreciada e usufruida
Aqui, na nossa igreja,
Que serve, de bebida,
Três ou quatros tonéis
Da melhor cerveja
Aos distintos fiéis.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Bekräftigen ist lügen

Pour la mondialisation et le génocide culturel

"I will never write
In this language
Of such imbecile men"
I said to them,
Imposin' my image,
I assured: "Alright?
I'm a true patriot, as you can see."
Now... Where is the damn irony?

PS: Δεν είμαι ένα κοσμοπολίτης

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Dostoiévski na roça

Le Canaille diz:
Vou para Pernambuco estudar frevo
Felipe diz:
E me deixar?
Le Canaille diz:
Sim...
Le Canaille diz:
Todo gênio é um tratante
Le Canaille diz:
E isso também se aplica aos músicos regionais, Maria...

Trilha sonora: Goianinha - Rolando Boldrin

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Uma Homenagem a trois!

Como todos vocês, velha platéia ausente, já estão habituados, aqui estou mais uma vez com algumas delícias literárias filadas de outros poetas. Aqui trago outra obra cotidiana pós-moderna intuitiva-dialética-jungiana de Toscano (há quanto já não ouvem este nome? Não, não estamos enamorados.) . Seria insensatez apresentar aqui, textos que, em certas circunstâncias, competem com os meus. Entretanto... vocês, corja de canalhas, não estão ainda preparados (maculados de valores morais rotos) para a doçura do egoísmo, então, para que continuem sempre voltando e satisfazendo-me com vossas ponderações idiotas, (para que eu possa assim, finalmente, apoucá-las) eis aí a concorrência:
(Durval, desce mais uma!)

Classificados

Necessita-se de empregada
Cinco vezes na semana
Que cozinhe, lave e passe
E seja boa de cama.

Guilherme Toscano

post-scriptum: Se, por algum motivo, alguém aqui tenha se ofendido, é bom estar ciente de que vou dormir bem esta noite.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Superação - Um canto ao Übermensch

"Derribar ídolos - isso sim, já faz parte do meu ofício."

Em um furor simbólico,
Comerei tua carcaça.
Ó... Melancólico
Homem, minha caça.

Hei de definhar,
Aos poucos, um a um,
Cada senso comum
Que semear.

Por derradeiro,
Te farás em pranto
E eu, no entanto,
Deixarei-te inteiro

Para que observe
Tamanha desgraça:
O fim da tua raça,
Que agora me serve.

O doce é para quem não conhece o amargo

"Se a tua dor te aflige, faz dela um poema."

Mesmo em analgia,
Ainda assim escrevo
Neste louco enlevo
De pura ironia.

Isto sim é poesia.
Mas que será que diria,
Este Eça de Queirós,
Lendo verso tão atroz?

Relato de um delirium tremens

São meia noite... Diz o Okaran que é tempo de mudança, de passagem. Não vejo muita evolução na minha situação, teimo sempre nos mesmos ofícios, pensar, ler e, claro, beber em demasia. E sempre que desvio desta trindade divina, acabo me arrependendo. Apesar de toda esta ânsia que me arrebata, sou ainda discípulo de Baco, não deixo a tragédia pender para um lado só. Frederico? Sente aí, meu velho. De qualquer modo:
- Laroiê, Exu!
E só para não dizer que te desrespeitei, dar-lhe-ei um bom cigarro. Pronto. Estamos reconciliados? Ótimo.Retomando... Presumo que as pessoas não mudem, as causas secretas são sempre as mesmas, só mudam as roupas. Machadão! Sinta-se a vontade. Por vezes penso se eu não precisaria de uma convicção, uma ideologia pela qual morrer, uma crença, algo que me preencha os dias vazios. Já cansou-me o recreio de gracejar com o amor. Mas não posso negar que enchem-me de um certo saudosismo, todas essas lembranças. Não, não... é a cachaça. Huxley? Venha cá, homem. Puxe uma cadeira. Olha só quem está aqui... Edmundo... Martinho... Bretano...
Que beleza, esta paisagem pálida e pontiaguda... Estes homens com suas carecas impregnadas de sebo... sorrindo, com os dentes castanhos, para as cinqüentonas lascivas de batom rubro, que impõem as saliências com estes decotes arqueados.
Um mulatame só... Digno dos botecos mais pestilentos! Grande Liminha, pegue uma cândida na minha conta.
Penso eu que sempre acabarei voltando para cá... Este bar é a minha casa... aqui venho arejar as idéias, esclarecer, clarificar... Aí está! Quero fazer daqui o meu jazigo! Que acha, Immanuel?
Epitáfio? Epitáfios são clichê, meu amigo. Sou irreverente, quero algo além... farei de um rótulo de vodka minha inscrição tumular. Sepulcralmente alcoolizado.
Sabe, Guto... vejo muitos de vocês aqui dando ênfase ao dualismo em suas obras... Que asnice!
O dualismo é corolário da imposição moral religiosa de bem e mal... somos todos além disso, além do bem e do mal, transvalorizamos todos os valores. Não obstante... não deixa de me instigar a obra que preza pelos meios soturnos. É de uma roupagem deleitável.
Meu bucho, meus intestinos, meu gargalo, meus beiços... está tudo imbuído de álcool. Estou sozinho... como sempre quis! Encontrei a paz de espírito que só se encontra no convívio dos livros, dos mortos e dos ausentes.
Evoé, minha turba!
- Evoé!
Que fazes aí introvertido, Plauto? Junte-se a nós.
João Paulo... sei que você, ainda que como eu, amante das promíscuas, sempre maldisse meu hábito de escolher mulheres pelo intelecto. À despeito disso, todas elas me pareceram, depois que rebentaram as férias, décadents. Sinto falta daquelas psiques atraentes...
Não é que eu queira difamá-las, é só uma leitura de conduta. Veja... não é o Watson na outra mesa? Velho carrancudo!
O quê? No balcão? Ora... sim... é ela! E como é deliciosa...Que bela moça...O quê? Ir ter com ela? Nunca! Já faz tanto tempo...Não sou de perecer por memórias. Está bem, está bem... já que instam tanto.
- Olá, minha formosura...
- Que queres?
- Quero este corpo esbelto.
- Saia daqui... estás bêbado.
-E tu... estás linda.
Ai... a maldita deu-me uma bofetada. Não era ela... era só uma garçonete.
Voltaire... és um zombeteiro.
Garçom... Traga mais uma!

Do domínio público

Em um dia nublado, desses de se dar apenas com as cobertas, ruminava a vida um desses velhos decrépitos, das madeixas alvas, preto que nem coivara tostada. O velho metia-se só consigo e seu cachimbo antigo, dos tempos da espada, mas de madeira boa, dissimulado pelo chapéu de palha, que lhe escondia um palmo e meio da cara.
Parecia que não tinha casa, não arredava o pé daquela sarjeta imunda que lhe servia de alcova. Não enchia ninguém, nem queria, valia-lhe muito só o cacoete que tinha. É que aquele velho, sem nome, sem nada... bicho-do-mato fora do nicho, engolia horas e horas, pela solidão, a espiar a majestosa cidade cinzenta, selva poligonal. E dizia a quem perguntava, com as palavras bem medidas, que só o roceiro, na simplicidade da mente e dos almejos, pode dizer:
- É que isso aqui é tudo meu, ninguém me toma!
Respondia com a mesma resolução para quem quer que fosse, igual máquina idosa entregue à poeira.
Um dia, desses que ninguém entende por que motivo chamam outro, se em nada é diferente, veio um bom mulatinho de nariz empinado, na lepidez da pressa, convencido que só, com o sarará bem penteado às maneiras da corte e terno de segunda de mal corte.
Parou no empório defronte à sarjeta. Gesticulou com a mão. Pediu com a voz maçante de palrador:
- Um café bem doce. Por favor.
Fitava com asco os zé-povinhos que lhe vinham à vista.
Em circunstância alguma havia de estar lá se não fosse o pouco dinheiro.
Ainda com altivez, desviou o olhar ao proprietário e indagou:
- Que tem aquele velho do outro lado da rua?
- Tem é nada. Ele é assim mesmo.
O mulatinho pôs-se a matutar, checando de soslaio se lhe assistiam à evidência de sua superioridade. Ao passo que os fregueses hauriam o caldo de estranheza que o mulato lhes preparou. De olhar obstinado, munido dos versículos que lhe ensinaram os brancos, foi o colonizado ter com o preto:
- Que faz aí?
Continuou o preto tácito, sorvendo as baforadas deliciosamente pela boca ressecada.
- Acho que você não me ouviu...
Nada do preto, nenhum esboço de olhar, nem de través.
- Perguntei que fazes aí!
De repente ressoou um sopro franzino de voz, era o preto:
- Só cuido do que é meu.
- E que que é teu?
- Minha mata.
- Que mata, homem?
Não vê que estamos em pleno centro urbano?
O velho soltou um suspiro de desdém e se calou novamente.
O capitão-do-mato continuou a atiçar:
- Anda, velho besta... Desembucha! Senão hei de arranjar um jeito de tirar-lhe daqui.
- Deixa-me em paz.
- Deixo-te em paz se me responder.
O velho tirou da algibeira um chumaço de fumo e preparou outra nuvem de fumaça lívida que se misturou rapidamente pelos pavimentos.
- Vamos, diga!Por um intervalo de tempo, só se percebia a brisa emanada das ventas dos dois. O mulatinho, uma pilha de impaciência, instava e o preto, pachorrento, ignorava o outrem. Eis que então o mulato, já ávido, por discutir e argumentar, limpa a testa molhada de suor e, sorrindo de escárnio, profere:
- Já sei que é... Você pensa que a cidade é sua, né? Negro bobo. Deve estar louco, só pode ser.
Pois eu poderia te explicar bem o que te faz tão louco, mas não perderia meu tempo com gente ignóbil feito você.
O negro assistia calado a toda aquela tagarelice. O mulato adestrado, não se contendo de apresentar o que tinha aprendido, dava vazão à conversa:
- Pois é, seu nego velho... Você já ouviu falar de Rousseau? Imagino que não. Não é do seu gabarito.
Já saciado com a citação, não procurou esbanjar-se do conhecimento enorme que as enciclopédias em promoção haviam-lhe dado.
Calou-se por um tempo.
Porém, o silêncio gritava aos seus nervos auditivos, mordia-lhe as orelhas, não era de sua índole deixar um negro tão burro ali, sem troco, estorvando o movimento do bom trabalhador.
- Não vai dizer nada?
- Dizer o quê, seu moço?
- Ora... Alguma cousa!
- Não tenho nada pra dizer.
Só o que vocês querem é tirar tudo o que eu tenho de mim.
- Ô, velho imbecil...tu não tem posse de nada não! Tu é pobre. E vai morrer pobre, afundado na cachaça, preto doido.
A serenidade do velho atormentava o mulato, já estouravam-lhe as veias do pescoço, a mente, embotava-se, a visão estava turva. Disse, em um esforço cabal:
- Vou chamar alguém para tirar-lhe daqui.
- Faz isso não, sinhô... Vai fazer isso por quê? Que que eu te fiz?
- Não é por mim. Por mim eu lhe deixaria aí, vivendo de fumo pelo resto da vida. Mas eu tenho meu dever como cidadão. Alguém precisa assear o lixo.
- Do que que o senhor me chamou?
- Lixo... é isso que o senhor é: A encarnação, se é que há carne nesses corpo fino, de todo o atraso, de todo a escória do nosso corpo social.
- Ora, seu...
O preto lançou-se sobre o almofadinha, que, tomado pelo nojo de toda aquela cultura estranha e inferior sujando suas roupas falsas, gritou, afoito, por algum ato de nobre de solidariedade.
Ainda que os berros agudos do mulato afeminado se alastrassem pelas ruelas terrosas da cidade, veementemente, insuportavelmente, ninguém foi capaz de ouvi-lo.
O curso ignaro dos miseráveis e dos filisteus persistia, surdo e intacto, das acordos ilícitos dos granfinos aos assaltos fulminantes da baixa bandidagem. Naquela tarde, a sociedade não chorou a morte de nenhum dos seus filhos dementes, mas sorriu um sorriso estranho, um sorriso novo e singelo de satisfação.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Hino à Piña Colada

Boêmio
Que tem nisto aqui?

Garçom
Creme de côco e abacaxi.

Boêmio
Oh... Soy loco por ti,
Mi bella amada.
Te quiero tanto.
Por ti, yo canto,
Piña colada!

Sobre a raiva

À guisa de prefácio

Bip!
Começou o dia. Acordam as chapas metálicas às luzes inquietantes do sol azul-róseo. É a última moda. Corram, corram, corram... que o dinheiro corre também. Que fome... que sede... Quanta velocidade, jesuscristo® inc.! Dança a humanidade aos pitorescos e monotônicos ritmos. Calcule a área deste poema.
- Cultura de rico é um rear, seu moço!
- E de pobre?
- Tamém.
Todo o pensamento humano cabe em uma pequena caixinha. Quem diria... parece tão pequeno agora! A arte é belíssima... Um amontoado de imitações retorcidas, seladas, carcomidas, servidas a la sorrisê falsê *Plim*
- Onomatopéias! Por quê não pensei nisso antes? Pode vender bilhões.
- Que fará com o dinheiro?
- Comprarei mais, ora.
Quem há de distingüir hoje que é homem e que é máquina? Quem é extensão de quem?
Último lançamento: $userania e vassalagem.
- Mas isso é plágio!
- Não, é retrô.

Sobre a raiva.

Era desses caras calvos, de unhas bem cortadas e dentes alvacentos. Boi entregue ao rebanho. Um primor de rotineiro. Tinha uns cabelames falsos, que sempre usava ao sair. Deglutia diariamente sua ração nutritiva, pura energia. Lixo industrial, overdose de carboidratos. Bom garoto! Seu rosto, escaveirado, os braços delgados, as perninhas fracotes. A pança? Monstruosa... Que interessa? Ainda tinha sua peruca. Pagava um curso de ginástica oriental mês que vem. Quem sabe algum mês que vem. Com lepidez e bom humor, sorriu e ingeriu seu carbonato de lítio. Nova fórmula, agora mais eficaz!
Dirigiu até o trabalho, as pernas não agüentariam o peso do corpo até a esquina.
- zé!
- Diga, Chefe!
- zé, vá ao banco preciso fazer um depósito na minha conta.
- OK. Onde está o dinheiro?
- Ora... que audácia! Leve o seu. É para isso que te pago.
- Tudo bem, Chefe.
Imprimiu um sorriso jubiloso e foi dar com o ofício. Lá chegando, viu tantas máquinas, sentiu-se em casa.
- Por favor... Gostaria de fazer um depósito.
A atendente, em um sorrir maquinal, impôs um contíguo grosso de papéis à mesa.
- Que é isso?
- Lista de impostos. Por favor, transite até o caixa 37.
zé olhou perplexo... Mas obedeceu à ordem com solicitude.
- Por favor... Gostaria de fazer um depósito.
Sobre a mesa surgiu outro tablado espesso de folhas brancas.
- Que é isso?
- Lista de impostos. Dirija-se até o caixa 21.
- Já tenho uma dessa.
- Não, senhor, esta é outra. Dirija-se até o caixa 21.
zé continuou, sempre mantendo seus bons princípios. Que bons princípios?
E por estes movimentos mecânicos sublimou-se a tarde de zé, em um vai-e-vêm deliberado e repetitivo. Esgotado, exausto, descrente de seus meios... reclamou um colóquio com o gerente.
- Senhor, o senhor não tem crédito o suficiente que outorgue uma conversa com o gerente.
zé estava pasmado, sentiu-se limitado e impotente, profundamente colérico. Ao ocaso deste período, zé, bufou como uma besta, exalando um bafo quente e pútrido, as veias engurgitaram-se e pulsavam loucamente o sangue, que era solução pura de adrenalina, os músculos enrigereceram, os olhos estavam rubros dos vasos robustos que escapavam às órbitas. Saltou sobre a máquina, derribando-a, comprimia os braços da presa co’as garras que lhe faltavam, espancou-a, dilacerou-a, esbroou-a e, ao final, soltou um clamor gultural vitorioso.
A energia somática da besta aniquilou violentamente a máquina. Em um instante, chegou a polícia e, em uma ação legítima pela integridade do Estado, a figura anômala foi baleada.
- Que monstro! Ainda bem que chegaram a tempo.
- Deus, que mundo...

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Mão única

Estava eu, absorto em minhas meditações obscuras e altamente prazerosas. Quando, subitamente, sobrevem-me uma mão lívida e carnuda, que, num gesto resoluto, coçou-me a perna. Mas que ser humano são poderia ter agido tão estranhamente?
Teria sido realmente um ser humano?
Teriam sido reflexos de minha mente doente?
Repasso esta pergunta antes para um fenomenólogo que para um psicanalista (Freud, o explicador que me desculpe, mas não confio em postulados, traga-me antes um banquete metafísico).
A restrição dos domínios da ciência da psiqué provém exatamente da sua aplicação prática (pensem sobre isto um pouco e verão que não estou sendo contraditório, pelo menos não de acordo com os meios racionais.)
Em um ligeiro instante, a manada de silhuetas que por mim, (de onde surgiu a curiosa mão) transitou... Desvaneceu no infinito corredor.
Que era aquela mão?

Prólogo na cama

Ele, deitado, abriu os olhos. Estudou o ambiente. Deu luz aos corpos débeis que o rodeavam. Impôs-se. Adjetivou-os, todos. Tornou-os, também, substantivos. Fez do mundo, o seu mundo. A seu modo. Observando a expressão atônita dos objetos que os cinrcundavam, disse:
- Eu lhes faço compreensíveis! - E após uma pausa, coçando a barba rala, retomou - Os compreendo como bem quero.
A voz áspera do homem se alastrou pelo quarto vazio. Abrindo alas à cadência do silêncio. Ó! E que doce silêncio era aquele. Nenhuma voz o contrapôs. Ninguém ousou diminuí-lo. Sorriu.
- Que seria de vocês sem mim? - disse, mordiscando os lábios, saboreando o cuspo fétido da madrugada.
Levantou o enorme corpo e, ostentando molemente os braços, dirigiu-se ao armário torto.
- Você não é nada - Ponderou ao móvel, que aceitou, resignado, o menoscabo. Experimentou outra vez:
- Nada! - O gordo catou as roupas e desceu lentamente, arrastando as chinelas ransosas escada abaixo. Que barulho horrível! Levando à mão as vestes reais e, lançando o olhar augusto à quietude da casa, foi-se embora o rei momo. Os móveis riam tacitamente do imbecil.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Briga de enchada


De repente, escorreu-lhe o sangue,
Dissolvendo em lama e suor
A abundante matéria mor,
De todo o enorme mangue.

O corpo foi ao chão, enxangue.
E, do trabalho, que fatiga
Fez-se logo boa briga:
O roceiro contra a gangue.

O caipira, em gestos pelos quais
Recebia os golpes vigorosos
Das enchadas marginais,

Ulteriormente, findou a luta,
Com um, ferido, feroz, clamoroso,
Grito :"Eu mato os filhos da puta!"