quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Prólogo na cama

Ele, deitado, abriu os olhos. Estudou o ambiente. Deu luz aos corpos débeis que o rodeavam. Impôs-se. Adjetivou-os, todos. Tornou-os, também, substantivos. Fez do mundo, o seu mundo. A seu modo. Observando a expressão atônita dos objetos que os cinrcundavam, disse:
- Eu lhes faço compreensíveis! - E após uma pausa, coçando a barba rala, retomou - Os compreendo como bem quero.
A voz áspera do homem se alastrou pelo quarto vazio. Abrindo alas à cadência do silêncio. Ó! E que doce silêncio era aquele. Nenhuma voz o contrapôs. Ninguém ousou diminuí-lo. Sorriu.
- Que seria de vocês sem mim? - disse, mordiscando os lábios, saboreando o cuspo fétido da madrugada.
Levantou o enorme corpo e, ostentando molemente os braços, dirigiu-se ao armário torto.
- Você não é nada - Ponderou ao móvel, que aceitou, resignado, o menoscabo. Experimentou outra vez:
- Nada! - O gordo catou as roupas e desceu lentamente, arrastando as chinelas ransosas escada abaixo. Que barulho horrível! Levando à mão as vestes reais e, lançando o olhar augusto à quietude da casa, foi-se embora o rei momo. Os móveis riam tacitamente do imbecil.

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito massa!
Talvez a gente não passe da idéia de alguém também - alguém um pouco presunçoso demais pra aceitar que talvez também seja só uma idéia. Talvez tudo só é porque assim se acredita ser... Quando você fecha os olhos, é tudo uma única massa compacta de nada: uma idéia de espaço preenchido pelos vazios que queremos ver =)
=***